Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, disse que vai responder às ameaças da Coreia do Norte "com fogo e fúria jamais vistos pelo mundo".
Enquanto isso, a Coreia do Norte ameaçou lançar mísseis contra a ilha de Guam, território dos EUA no Pacífico habitado por 163 mil pessoas.
E tudo isso acontece em meio a informações de que Pyongyang possa ter
finalmente conseguido miniaturizar uma ogiva nuclear para caber em um
míssil intercontinental - uma perspectiva temida há muito tempo pelos
Estados Unidos e seus aliados asiáticos.
Seria isso um prenúncio de um conflito militar?
Especialistas dizem que não há motivo para pânico. Eis as três razões para isso:
1. Ninguém quer guerra
Isso é o mais importante. Uma guerra na península coreana não é do interesse de ninguém.
O principal objetivo da Coreia do Norte é a sobrevivência - e uma
guerra com os Estados Unidos poderia comprometer isso. Como o analista
para Assuntos de Defesa da BBC Jonathan Marcus pontuou, qualquer ataque
norte-coreano contra os EUA ou seus aliados no contexto atual poderia
rapidamente evoluir para uma guerra maior - e é preciso assumir que o
regime de Kim Jong-un não é suicida.
Aliás, é por isso que a Coreia do Norte tem se empenhado tanto em se
tornar uma potência nuclear. Pyongyang parece acreditar que ter essa
capacidade protegeria o regime - aumentando o preço para derrubá-lo. Kim
Jong-un não quer seguir o caminho de Muammar Khadafi, na Líbia, ou
Saddam Hussein, no Iraque. Nenhum dos dois possuía armas nucleares.
Andrei Lankov, da Univeridade de Kookmin, em Seul, disse ao jornal
britânico The Guardian que "a probabilidade de conflito é muito baixa",
mas que a Coreia do Norte "tampouco estava interessada em diplomacia" a
essa altura.
"Primeiro eles querem ter a habilidade de limpar Chicago do mapa, aí
então eles estarão interessados em soluções diplomáticas", disse Lankov.
E quanto a um ataque preventivo americano?
Os Estados Unidos sabem que um ataque à Coreia do Norte poderia forçar o
regime a retaliar atacando Coreia do Sul e Japão, aliados dos EUA.
Isso poderia resultar em muitas mortes, incluindo as de milhares de americanos - tropas e civis.
Além disso, Washington não quer correr o risco de que sejam lançados mísseis contra cidades americanas.
Por fim, a China - o único aliado de Pyongyang - ajudou a manter o
regime precisamente porque seu colapso poderia ser pior para ela
estrategicamente. Tropas americanas e sul-coreanas a um passo da
fronteira chinesa formariam um cenário que Pequim certamente prefere
evitar - e é isso o que aconteceria em caso de guerra.
2. Palavras, não ações
Trump pode ter ameaçado a Coreia do Norte com uma linguagem incomum para um presidente americano, mas isso não significa que os Estados Unidos estejam marchando rumo à guerra.
Como uma fonte militar anônima disse à agência Reuters: "Só porque a
retórica fica mais agressiva não quer dizer que nossa postura muda".
O colunista do "New York Times" Max Fisher concorda: "São os tipos de
sinais, não os comentários bruscos de um líder, que mais importam nas
relações internacionais".
Além disso, depois dos dois testes de mísseis intercontinentais da
Coreia do Norte em julho, os Estados Unidos tentaram uma tática
diferente - pressionar Pyongyang através de sanções do Conselho de
Segurança da ONU.
E seus diplomatas têm mostrado otimismo sobre um eventual retorno à
mesa de negociações, apontando para o apoio de China e Rússia.
Esses dois países enviam sinais conflitantes a Pyongyang, mas também moderam a retórica agressiva do presidente Trump.
Ainda assim, alguns analistas dizem que um movimento mal interpretado
no contexto de tensão poderia levar a uma guerra por acidente.
"Poderia ocorrer uma falha de energia na Coreia do Norte que pudesse
ser interpretada como um ataque dos EUA. Ou os EUA podem cometer um erro
[na Zona Desmilitarizada]", disse à BBC Daryl Kimball, do centro de
estudos americano Arms Control Association. "Então há várias formas de
cada lado errar o cálculo e a situação acabar saindo do controle".
3. Nenhuma novidade
Como pontua o ex-secretário-assistente de Estado dos EUA PJ Crowley,
Estados Unidos e Coreia do Norte chegaram perto de um conflito armado em
1994, quando Pyongyang se negou a permitir a entrada de inspetores
internacionais em suas instalações nucleares. Na ocasião, a diplomacia
venceu.
Com o passar dos anos, a Coreia do Norte fez ameaças incendiárias
contra Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul com regularidade, muitas
vezes ameaçando transformar Seul em um "mar de fogo".
E a retórica de Trump não é exatamente sem precedentes para um presidente americano.
"De várias maneiras diferentes, ainda que de uma forma não tão
colorida, os Estados Unidos sempre disseram que, se a Coreia do Norte
atacar, o regime deixará de existir", diz Crowley.
A diferença desta vez, acrescenta ele, é que o presidente dos Estados
Unidos parece sugerir que tomaria uma atitude preventiva (apesar do
secretário de Estado, Rex Tillerson, ter descartado essaopção depois).
Esse tipo de retórica belicosa imprevisível vindo da Casa Branca não é comum e preocupa as pessoas, dizem analistas.
Ainda assim, a Coreia do Sul - o aliado americano que mais tem a perder
em um confronto com o Norte - não parece estar muito preocupada.
Um assessor da Presidência em Seul disse a jornalistas que a situação
não chegou a um nível de crise e que é muito provável que tudo seja
resolvido pacificamente.
Isso é motivo para otimismo.
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